Thursday, January 04, 2007

CASOS PARA PENSAR 3) DANIEL

3) O JOVEM ADVENTISTA : Agora um caso incrível, difícil de analisar. Na última empresa onde trabalhei tínhamos uma dificuldade especial em contratar bons profissionais, em parte devido a falta de mão de obra capacitada em Ibitinga, em parte devido a própria administração da empresa, que não valoriza nem investe no elemento humano.
Estávamos com uma vaga na sessão de Peças em aberto já havia algum tempo. E, finalmente surgiu um bom candidato. Capacitado, com experiência no ramo, enfim um currículo excelente. Vamos chamá-lo de Daniel (não me lembro mais seu nome).
Veio a entrevista, e a confirmação: pessoalmente ele realmente tinha todas as condições de ser a solução para aquela função vital.
Na verdade, além da capacitação profissional, Daniel aparentava ter uma personalidade muito interessante, solícito, interessado, atualizado, bem apresentável, comunicativo, e principalmente transmitia um ar de sinceridade, com um olhar bem transparente, seguro de si, característica de pessoas honestas.
Estávamos trabalhando para reorganizar o Depto. devido a desvios e roubos, alguns pequenos, outros maiores, daí a importância de contratar alguém honesto, de bons princípios.
Mas não tardou para eu descobrir, ao término da primeira conversa, e também nas próximas entrevistas que enfrentaríamos uma certa barreira com o Daniel.
Verifiquei que uma boa parcela daquelas suas virtudes deveria ser decorrente de sua fé religiosa. Ele era membro praticante da Igreja Adventista do Sétimo Dia.
E, como tal, guardava fielmente o sábado como dia consagrado ao Senhor e à suas atividades religiosas.
E foi este o ponto de discórdia: nós eventualmente iríamos precisar que ele trabalhasse em regime de plantão alguns sábados. E, como Adventista fiel, ele não concordava em trabalhar aos sábados. Mesmo argumentando que seria muito esporádico, talvez uns 5 ou 6 sábados por ano, ele não aceitou.
Contra-argumentou muito, tentando mostrar que poderia fazer muito bem feito seu trabalho nos demais dias da semana, que poderia trocar com colegas da sessão os possíveis sábados, etc..
Mesmo sabendo que ele realmente conseguiria fazer um trabalho melhor que os demais colegas, não me parecia justo deixá-lo isento do rodízio que fazíamos para o plantão dos sábados.
Certamente até os colegas aceitariam, se eu pedisse, que algum o substituísse aos sábados. Mas eu não podia abrir exceções.
De meu lado, tentando investigar mais a fundo o seu entendimento das escrituras, e também para checar os limites de sua fé em Deus, na sua Igreja, busquei explorar o tema em todos os aspectos possíveis.
E, o que emergiu desta exaustiva batalha? O lado radical do Daniel.
Ele preferiu perder a oportunidade, numa cidade onde empregos deste nível são raríssimos, para não quebrar um convenio, que segundo ele, não era com a Igreja, mas sim com o Senhor.
É claro que fiquei bem impressionado com ele, e até o elogiei por sua fidelidade.
Mas em alguns momentos da conversa, sabendo que ele estava seguindo uma Igreja não verdadeira, sabendo que o Dia do Senhor foi mudado por Deus, do Sétimo para o Primeiro dia da Semana, sabendo que ele estava sendo induzido a erro, e que ele era uma pessoa de boa fé, senti algumas vezes o impulso de tentar demovê-lo de sua crença.
Porém, em todas nossas conversas, senti que não era certo forçar nada. Em primeiro lugar não sentia que era direito transformar uma entrevista de emprego em debate de religião.
Mas o que mais me tocou, foi sentir que o Senhor estava no controle daquela situação. Senti que o Senhor estava satisfeito com a fidelidade daquele jovem. Mesmo não estando na sua Igreja Verdadeira, ele demonstrava uma força de caráter admirável em obedecer aos mandamentos, da maneira como lhe fora ensinado. Ainda que, errônea. Sabemos que o Senhor tem pessoas boas em todas as religiões, e vi que estas passam por experiências importantes para sua preparação, para uma dia, quando estiverem prontas, possam receber o verdadeiro Evangelho através dos Missionários.
Aprendi a continuar dando valor a experiências de vida e praticas religiosas de quem quer que seja.
Acho que afinal o Daniel nem perdeu muito, pois eu mesmo saí da empresa pouco tempo depois.

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